Volume 10, Nº1, (2025)
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O consumo de substâncias psicoativas em meio prisional tem um grande impacto na vida cotidiana dos reclusos pois afeta não só a sua saúde, mas também as suas
expectativas de reinserção social, a segurança e o funcionamento dos estabelecimentos prisionais.
Calcula-se que uma em cada três pessoas presas em todo o mundo tenha consumido uma substância ilícita durante o período em que esteve preso. Em Portugal e segundo o Inquérito Nacional sobre Comportamentos Aditivos em Meio Prisional (ICAD 2023), cerca de 63,4% dos reclusos afirmaram já ter consumido substâncias ilícitas. A cannabis é a substância com maior consumo em meio prisional, logo seguida pelo consumo de heroína e de cocaína. Se considerarmos que nos 49 Estabelecimentos Prisionais que existem em Portugal estão mais de 12.000 pessoas em situação de reclusão, vemos que o número de consumidores de drogas nas prisões portuguesas é muito significativo. Mas, se temos números sobre os consumidores pouco se sabe sobre o tratamento para os problemas com o consumo de substâncias em meio prisional.
Em geral, as intervenções eficazes no combate aos problemas da droga na comunidade também se revelam eficazes nas prisões. Portugal tem sido pioneiro na abordagem ao tratamento numa perspetiva de saúde pública e no contexto prisional verificamos que o programa de metadona ou de buprenorfina estão nas prisões portuguesas, mas o acompanha- mento em consulta por equipas multidisciplinares (médicos, psicólogos, enfermeiros) existe apenas em alguns estabelecimentos prisionais. Esta cobertura desigual entre estabelecimentos prisionais é uma lacuna que muitas vezes põe em causa a eficácia de um programa terapêutico bem como a sua continuidade quando o recluso sai em liberdade. O rastreio aleatório de testes para pesquisa de metabolitos de drogas na urina é um dos métodos mais comuns utilizados pelas prisões para monitorizar o consumo de drogas. E a presença de uma aná- lise positiva pode ter consequências negativas para o recluso (precárias, emprego, mudança de cela).
Por outro lado, a crescente utilização das novas substâncias psicoativas (NSP) nas prisões é preocupante e coloca novos desafios a todos os níveis. Estas substâncias sintéticas entram mais facilmente nas prisões circulando sob formas disfarçadas (papel, líquidos, sprays), são mais fáceis de vender, são mais baratas e geralmente são indetetáveis pelos testes de drogas mesmo em laboratórios mais avançados. O seu consumo pode ser mais prejudicial do que o consumo de drogas tradicionais, com efeitos a nível físico e mental graves como episódios psicóticos, convulsões, perda de consciência, problemas cardíacos, dependência rápida e até a morte.
Recentemente os jornais diários deram conta da presença de NSP, sob a forma de papel, nas prisões portuguesas. Uma simples folha de papel é impregnada com uma substância de potência elevada. O facto de o produto ser muito forte faz com que seja colocada no papel pouca quantidade dessa substância, permitindo assim que a impregnação passe despercebida pois geralmente não há manchas visíveis ou alterações na textura do papel.
E aqui, voltamos à realização do teste obrigatório nas prisões onde o consumo de cannabis, por exemplo, é penalizado porque o teste o deteta e nada se faz perante o consumo de uma NSP que é indetetável, mas que trás maiores riscos para o consumidor e para o próprio estabelecimento prisional. A ausência de deteção pode levar à desvalorização do consumo destas NSP e, consequentemente, a um aumento do seu consumo e à falta de respostas adequadas.
Neste sentido, o consumo de drogas nas prisões portuguesas exige uma resposta multidimensional que vá para além da punição. Por isso é necessário apostar numa maior ligação entre os serviços prisionais, serviço de justiça e serviços de saúde de modo a podermos oferecer a esta população serviços de prevenção do consumo, deteção, tratamento e uma planificação da saída em liberdade, eficazes.
P.S. No final deste ano de 2025 os órgãos sociais da Associação Portuguesa de Adictologia concluem os dois mandatos permitidos pelos estatutos. Como presidente da direção quero aproveitar para deixar aqui o meu grato reconhecimento ao Dr. Nuno Miguel, diretor da Revista Adictologia, pela sua disponibilidade, o seu interesse, os seus ensinamentos e a facilidade de trabalhar em equipa que sempre demonstrou na edição desta revista. Apesar de algumas dificuldades podemos afirmar que a revista tem tido uma aceitação e procura elevada, cada uma das revistas saídas após 2020, ano da Covid19, têm mais de 10.000 visualizações. Certamente que vamos continuar com o Dr. Nuno Miguel na direção da revista, mas para isso precisamos também dos nossos leitores e daqueles que nos enviam artigos pelo que só me resta acrescentar, queremos continuar a contar consigo caro leitor.
Rocha Almeida
Diretor
Nuno Silva Miguel
Conselho editorial
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Rocha Almeida
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Propriedade
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Correspondência: Rua Luís Duarte Santos, nº 18 – 4º O
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www.adictologia.com
Desenho e Paginação
Henrique Patrício
ISSN – 2183‑3168
Publicação Semestral